Antônio Frederico Ozanam

 

 

 

No dia 22 de agosto os vicentinos comemoram mais um ano da beatificação de Antônio Ozanam nasceu em Milão na Itália, mas logo após seu nascimento, seus pais se mudaram  para   a França, onde ele cresceu e se educou. De família humilde, sempre dedicou-se aos  estudos   chegando a doutorar-se em Direito e Letras, sendo nomeado professor da  Sorbone, uma das   mais conceituadas universidades da Europa e do Mundo.

Criado num ambiente bastante religioso, que primava pela fé em Deus e a caridade, exercida principalmente por seu pai, Ozanam se manteve firme no ideal cristão e na sua grande devoção à Virgem Maria, a quem dedicava diariamente um terço. Foi assim, com uma vida de fé e devoção, exemplo de amor à família, ao próximo e a Jesus que Ozanam morreu precocemente no dia 8 de setembro de 1853, com apenas 40 anos, no dia da Natividade da Virgem. 

Antônio Frederico Ozanam foi o criador da Sociedade São Vicente de Paulo, inspirada na vida e na obra do santo. A iniciativa foi tomada em resposta a um desafio feito por seus colegas de faculdade que lhe disseram ser fácil falar em cristianismo sem contudo fazer nada para resolver os problemas sociais dos pobres e oprimidos. Foi então que Ozanam se reuniu com alguns colegas, também católicos, para dar uma resposta à altura daquele desafio, iniciando uma obra de assistência espiritual e material às pessoas pobres, carentes, desafortunadas e infelizes. 

No dia 23 de abril de 1833 realizou-se a 1ª Conferência Vicentina da Sociedade São Vicente de Paulo. Hoje, a obra e o espírito vicentino espalhou-se pelo mundo todo, estando presente em mais de 132 países, nos cinco continentes. No Brasil, o movimento iniciou-se em agosto de 1872, no Rio de Janeiro, e hoje são mais de 250 mil membros atuantes e espalhados por todo o país. 

A tradicional saudação vicentina, "Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo", é sinônimo de caridade e solidariedade, lembrando que essa é uma obra de Jesus, inspirada na vida, na caridade e na espiritualidade de São Vicente de Paulo.

 

A VIDA E A ÉPOCA DE FREDERICO OZANAM


Ano: 1800. País: França. Um novo século se inicia. Este ia ser o Século do Povo, um século de liberdade, igualdade e fraternidade./ 
Dez anos antes, a violência e a efusão de sangue da Revolução Francesa haviam marcado o princípio destes valentes ideais. Estes ideais/, como a República, iam desabar em breve./

Pessoas desempregadas./ As fábricas funcionavam graças ao trabalho das crianças./ Os Pobres viviam em uma nova e monstruosa paisagem da revolução industrial,/ que fazia da França um foco de agitação./ A nova sociedade não proporcionava um mundo melhor com suficiente celeridade./

Em 1815, o antigo sistema parecia ainda, para muitos, o melhor. /O Congresso de Viena restaurou a antiga ordem política./ A classe dirigente regressava ao poder./

Um jovem casal, unido desde o principio do século,/ vivia no meio destes transtornos./ João Antônio, médico, e sua mulher, Maria, formavam uma formidável equipe./ Juntos, davam o tempo que dispunham aos Pobres,/ proporcionando-lhes assistência médica, enquanto criavam sua própria família./

Iriam ter 14 filhos, dos quais 11 iriam morrer./ Um dos sobreviventes chamava-se Frederico... Antonio Frederico Ozanam./


NENHUMA ÉPOCA COMO A DE AGORA: 

Se existe uma palavra que resume Frederico Ozanam/ é a esperança./ Frederico acreditava que existia uma melhor forma de fazer as coisas,/ uma maneira mais justa, uma maneira cheia de compaixão./ Nunca perdeu a esperança e sempre acreditou que poderia aprofundar-se nesse aspecto./ 

Frederico era cristão,/ católico e vivia em uma região rural que rapidamente ia se tornando uma potência industrial./ Era um mundo completamente novo./
Ninguém sabia realmente o que era uma potência industrial,/ como devia parecer-se, que ações realizar, nem de que maneira devia funcionar./Qualquer que fosse a forma que este novo mundo ia tomar,/ Frederico acreditava, ainda jovem, que sua fé e seu cristianismo poderiam ajudar o novo mundo a se converter em “um mundo mais justo”./


FREDERICO ABANDONA O SEIO FAMILIAR:

Com 19 anos, Frederico sai de casa, em Lyon, e segue para Paris./ Era um rapaz do interior que veio para cidade grande e esta cidade acabava de se reestabelecer da Revolução de 1813, dois anos antes./

Luís-Felipe, o novo rei, já se encontrava sob uma enorme pressão;/ enfermidades, superpovoação e baixos salários eram muito comuns./ Houve outra mobilização em favor da República./ O sentimento anticlerical era forte em Paris,/ especialmente na universidade onde as novas ciências dominavam o pensamento./ Foi ali, na Sorbonne,/ donde Frederico ia estudar a carreira de Direito, tal e como seu pai lhe tinha desejado./

Muitos eram aqueles que, na universidade,/ viam o cristianismo como o “inimigo do progresso social”;/ ali onde os padres e os bispos não eram mais que os associados da odiada classe dirigente./

Para Frederico, foi uma grande adaptação./ Fora da universidade, vivia numa pensão./ Enquanto uns estudantes se deleitavam na sua nova liberdade,/ Frederico sentia-se isolado./ O cientista André Ampère acolheu Frederico na casa dele como hóspede./ Ampère, um brilhante professor universitário,/ era pioneiro no estudo da eletricidade./ Pode-se observar o mesmo brilho em Frederico./ Para Ampère, não existia conflito entre o cristianismo e o progresso./ Sua suave influência ajudou muitíssimo Frederico;/ iam permanecer amigos por toda vida./

Porém, Frederico, com 19 anos,/ desejava mais que uma suave influência./ Com a ajuda de vários amigos,/ iniciou um grupo de debate na casa do proprietário de um jornal local:/ José Bailly. O grupo ou a Conferência se reunia cada semana./ Tinha como propósito discutir sobre a questão de que a reforma social e o cristianismo poderiam caminhar de mãos dadas./ 

Era uma atitude de valor, considerando a época./ Desejavam fazer ressaltar a dívida da história com o cristianismo./ Com a força dos argumentos, iam converter as multidões./ O que pareceu então uma grande ideia se tornou um lamentável fracasso./ Isto chamou a atenção deles, porém o movimento alienou mais estudantes dos que poderia ter ganhado adeptos mais conscientes./ 

Não obstante, este pequeno grupo se fez amigos;/ nenhum deles percebeu a sucessão de acontecimentos que iam colher de todo isso;/ nenhum deles tinha consciência do impacto que tais acontecimentos iam ter mais para frente./ 



CRESCENDO RAPIDAMENTE EM PARIS:

Do outro lado da cidade, em um dos bairros periféricos de Paris, havia uma mulher que ia possuir uma grande influência em Frederico: Irmã Rosalie Rendu, uma Filha da Caridade. As Filhas da Caridade são uma ordem religiosa de freiras fundada por São Vicente de Paulo, duzentos anos antes. Irmã Rosalie era a Madre Teresa do século XIX em Paris. Durante cinquenta anos, trabalhou com e para os mais Pobres dos Pobres. Contra sua vontade, foi galardoada pela mais alta recompensa concedida na França: a “Cruz da Luta e da Honra”.

José Bailly conhecia a Irmã Rosalie. Bailly lhe escreveu no início dos anos 1833: “Envio-lhe esses dois jovens rapazes. Sua caridade é espiritual. Mas são muito jovens e impetuosos e necessitam de uma orientação”. Estes dois jovens eram Frederico Ozanam y Augusto Le Taillandier.

Augusto se cansou do que ele chamava « as palavras estéreis do grupo de debate ». Queria ajudar aos Pobres diretamente. Também ocorria o mesmo com Federico. Desta forma, com 20 anos completos, Frederico, Augusto e mais cinco membros, formaram a primeira Conferência de Caridade, conhecida mais tarde na França e no mundo inteiro com o nome de “Sociedade de São Vicente de Paulo.

Irmã Rosalie repassou a Frederico e Augusto o nome de três famílias pobres. Sugeriu que seu grupo adotasse cada família e lhes proporcionasse a ajuda que podiam dar-lhes. Seu conselho era simples: «Sejam amáveis e ame-os. Pois o amor é o primeiro presente para os Pobres». “Apreciarão a gentileza e o amor de vocês, mais que nada.” 

Até então, a única experiência de Frederico e Augusto com os Pobres tinha sido deixar um pouco de madeira para fazer fogueira para uma pessoa que sofria de frio. Frederico lembrou-se de mais tarde quão nervosos estavam quando subiam as escadas até o celeiro do homem. Deixaram cair a madeira e abandonaram o lugar tão depressa como puderam. Frederico percebeu que Irmã Rosalie tinha muito que ensinar-lhes ainda.

Os membros desta primeira Conferência tinham 23 anos ou menos. Bailly era a exceção; com 40 anos, representava o pai. Graças às suas capacidades nos negócios e seu amadurecimento, rapidamente o nomearam Presidente.

O grupo sabia que tinha muito que aprender, tanto no lado emocional, quanto no aspecto espiritual. Cada semana encontrava-se, rezava e debatia sobre o trabalho de caridade. Evitava as discussões e animavam-se seus membros. 
A ajuda vinha constantemente dos mesmos Pobres e como Irmã Rosalie tinha dito: “Quando vos encontreis com os Pobres, Cristo é a quem encontrais”.

Na medida em que os Pobres faziam parte de suas vidas, a oração também vinha fazer parte delas. Para Frederico, o Evangelho tomava agora um sentido completamente diferente. A partir desses momentos, Frederico lia uma passagem do Evangelho todos os dias: chamava isto de seu “pão de cada dia”. A dificuldade estava em pôr em prática.

O crescimento do número de Conferências foi assombroso. Antes que o último dos membros fundadores tivesse falecido, nas últimas décadas do século, a Sociedade de São Vicente de Paulo contava com mais de 7 000 Conferências em mais de 30 países. Na medida do possível, este pequeno grupo de amigos tinha, de fato, dado àquele século “a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade”. 


OUTRAS COISAS NA MENTE:

Frederico tinha muitas coisas na mente. Por um lado, pretendia que as Conferências de Caridade ajudassem aos mais necessitados diretamente, e pelo outro, desejava que o trabalho da Sociedade acolhesse a um público mais amplo, em particular alcançando a classe média, de acordo com as necessidades dos Pobres. Então, talvez, ele pensava que o povo da França poderia começar a erradicar as causas da pobreza. 

Contava com forte apoio do Arcebispo de Paris, Dom Affre. Por sua vez, numerosos jovens sacerdotes se mostraram entusiasmados com as ideias de Frederico. 

Em 1838, Frederico, agora com 25 anos de idade e sendo o mais jovem professor da Universidade de Lyon, denunciou os efeitos perversos do novo “liberalismo econômico”. Condenava uma economia em que os Pobres trabalhadores criavam riquezas das quais nunca poderiam desfrutar. Dizia que a caridade não era suficiente para resolver estes problemas. Devia existir uma justiça entre trabalhadores e empregadores. Pediu um mercado laboral regulado com a ajuda de controles por parte do Estado e de trabalhadores organizados. Para França e para a época, aquelas ideias eram radicais.

Enquanto se preparava uma nova revolução, Frederico organizava sua própria revolução: se apaixonou. Em 1841, tinha 28 anos, e Amélia Soulacroix estava muito presente na mente de Frederico. Casaram-se no mesmo ano. 

Longe de suavizar sua paixão pela reforma, a vida de casal parecia animar-lhe ainda mais. Graças ao apoio de Amélia, aceitou um salário mais baixo por uma vaga de professor na Sorbonne. Em Paris, podia estar no coração da ação social católica. No ano seguinte, a Sociedade de São Vicente de Paulo contava com 2.000 membros só na cidade de Paris. Como observou Frederico, as Conferências ajudavam agora uma família a cada quatro na cidade.

Enquanto crescia o número de membros, as pressões na França e na Europa se notavam cada vez mais. Durante este período, Frederico era uma das vozes católicas dominantes, entre os que exigiam uma reforma social. Em 1848, a revolução varreu a França e uma nova república democrática foi proclamada. Frederico não podia permanecer em silêncio. Aproveitando o momento, em parceria com o professor de teologia Maret, Ozanam publica o jornal “A Nova Era”, que apoiava a frágil república.

Nesta situação de caos, o jornal foi amplamente lido. As pessoas o elogiavam ou o condenavam. O jornal defendia a proteção das crianças; o trabalho legalizado; uma pensão para aqueles que estavam enfermos e também para os idosos; horas de trabalho reduzidas; um imposto progressivo sobre a renda no lugar de impostos indiretos; a distribuição de lucros; assim como uma arbitragem obrigatória no caso de disputas industriais.

Para a classe dirigente que ia suprimir a revolução de maneira violenta, tais reformas eram simplesmente inconcebíveis. Aqueles como Frederico que decidiram fazer ouvir a sua voz se colocavam em perigo, e também colocavam em perigo a todos que estavam perto deles. A situação se tornou muito perigosa e isto iria ficar tragicamente claro.

Em junho, no coração da luta e a instigação de Frederico, o Arcebispo Dom Affre, um dos expoentes da “Nova Era”, subiu às barricadas. Enquanto negociava a paz entre os insurgentes e o Exército, Monsenhor Affre, um dos poucos homens respeitados por ambas as partes, foi atingido por uma bala perdida. 

Três dias mais tarde, o Arcebispo ferido, o defensor mais forte e impetuoso de Frederico, morria. A notícia difundiu-se em toda Europa. Frederico estava abatido.
O exército iria esmagar os trabalhadores. Uma onda conservadora varreu a França. « Liberdade, Igualdade e Fraternidade » já era um lema proibido. 

A própria Igreja viu-se na maré conservadora, e pela morte do Arcebispo, ficou em silêncio em quase todas as questões sociais. O sonho de Frederico de uma Igreja que iria promover fortemente a reforma social viu-se aniquilado. Frederico não viveria o tempo suficiente para vê-la regressar ao centro da cena.

Ironicamente, este mesmo ano teria a publicação de um Manifesto, até então desconhecido, o Manifesto Comunista. Iriam passar 43 anos antes que a Igreja respondesse com seu próprio manifesto referente “a condição da classe operária” pelo Papa Leão XIII.

Apesar da tragédia, Frederico continuou fazendo ouvir a sua voz, convidando mais católicos para trabalharem na Sociedade de São Vicente de Paulo, permanecendo perto dos Pobres em qualquer situação e ficando perto Deles em seu sofrimento.



NENHUMA ÉPOCA COMO A DE HOJE:

A tensão dos últimos acontecimentos e o combate contra a miséria começaram a fazer sentido. A saúde de Frederico iria declinar rapidamente. Apesar de todo o incentivo e os cuidados de Amélia, Federico, então com 35 anos de idade, permanecia acamado durante meses; só lhe restavam cinco anos de vida. 

Buscando uma solução, Amélia e ele decidiram viajar na companhia da sua única filha, Maria. Para Frederico, não existia outro tempo do que o tempo presente e o fato de viajar lhe proporcionava novas oportunidades. Começou a fazer palestras em toda França, Itália e fora dela; no momento de seu aniversário de 39 anos, 19 anos depois ter nascido a primeira Conferência, a Sociedade se havia estendido com mais de 40.000 membros em toda a Europa e nas Américas.

Em cada ocasião, combinava seus talentos de universitário, jornalista, ativista político com o fim de promover os direitos da classe operária e dos Pobres. Ele continuou sendo uma das vozes dominantes da reforma social no seio da igreja francesa. Os que governavam nesse tempo a França estavam voltados para si mesmos e cansados das reformas. Frederico falava de mudanças com paixão, mas não o escutavam.

Em 1853, na metade do século XIX que ele queria tanto que houvesse mudança, Frederico faleceu. Muitos de seus amigos, sua mulher Amélia e sua jovem filha Maria permaneceram a seu lado; tinha 40 anos. Ao longo de seus últimos dias, Frederico perguntou: “Por que haveria de temer a Deus a quem tanto amo?”. O medo nunca regeu a vida de Frederico. Quando pensava que devia agir, agia. Quando pensava que devia falar em nome dos Pobres ou de sua fé ou no nome de uma sociedade mais justa, se negava a permanecer em silêncio. Inspirou a seus amigos com o fim de que aceitassem o desafio que era apresentado para eles e que agissem. Era sua época, seu século, sua sorte de gritar e de compartilhar: “Liberdade, Igualdade, Fraternidade!”.

Hoje em dia, a Sociedade de São Vicente de Paulo está presente em cerca de 150 países. Por meio de seus 750.000 membros, o trabalho e a inspiração de Frederico e de seus amigos continua. O mesmo ocorre com o desafio!